domingo, 29 de maio de 2016

Ana Paula Valadão: entre advogados e promotores

A cantora Ana Paula Valadão: polêmica com a C&A

Na última semana, a cantora Ana Paula Valadão, do ministério Diante do Trono, pertencente à Igreja Batista da Lagoinha (BH), viu-se envolta em grande polêmica nas redes sociais, devido a uma postagem em seu perfil no facebook (veja aqui o post: https://www.facebook.com/anapaulavaladaodtoficial/posts/1056824397735832:0). Senti-me desconfortável em permanecer em silêncio, e passo a expor minhas considerações.

UM CONCEITO CORRETO

Preliminarmente, entendo que a motivação de Ana Paula está correta. Ela não ergueu qualquer estandarte estranho ou mesmo avesso ao cristianismo. Todo o que professa a fé cristã deve sim opor-se à imposição da ideologia de gênero. Óbvio refiro-me aqui aos que têm na Bíblia Sagrada sua única regra de fé e prática, e entendem-na não como um livro qualquer, mas como Palavra de Deus inerrante, infalível, suficiente e cabal. O que deve ficar claro é que o problema não foi a propaganda em si, mas sua força motriz, o princípio em que se apoia. O marketing foi mera sombra de algo muito maior. O repuxar da maré traz imediatamente a onda.

O que dizem as Escrituras? Sendo econômico: que o único relacionamento conjugal aceitável perante Deus é o monogâmico, e entre homem e mulher (Gênesis 2.24); que o homossexualismo faz parte das relações citadas por Deus como ilícitas (Levítico 18.22); que foi essa uma das grandes razões contribuintes para a destruição da região de Sodoma e Gomorra (Gênesis 19.4-13); que se trata de algo contrário à natureza humana (Romanos 1.26-27); que é prática impeditiva aos que pretendem herdar o Reino de Deus (1 Coríntios 6.10). 

Ora, isso não se torna uma vicissitude epistemológica ao homossexual (ou simpatizante) convicto e esclarecido, pois nada obstante seu conceito acerca de Deus, fato é que para manter coerência com sua escolha de vida, há necessariamente que desconsiderar o conteúdo das Escrituras Sagradas. A unicidade do texto canônico, de Gênesis a Apocalipse, não admite que determinadas perícopes sejam aceitas e outras não; que se considere Palavra de Deus apenas aquilo que se lhe interessa ouvir de Deus. Os preceitos bíblicos não são seletivos: deles nada se retira, nem se acrescenta (Apocalipse 22.18-19). Ninguém é obrigado a crer na Bíblia. No entanto, optando-se por crer, deve-se fazê-lo em sua inevitável completude e inteireza.

UM MÉTODO EQUIVOCADO

Parece claro que o grande percalço de Ana Paula se houve na forma da abordagem. É desejável que uma pessoa pública, de projeção internacional, midiática, com poder de massa em mãos, tenha um pouco mais de perícia ao evidenciar sua opinião. O método nem de longe foi o melhor. Por vários motivos.

O boicote proposto foi completamente desnecessário. É como os cristãos que não compram sapatos da Spatifilus, roscas da Padaria Prado (fica em Governador Valadares, interior de MG. Uma verdadeira iguaria!), acarajés, Coca-Cola ou produtos Disney. Sem falar na série de implicações se tal boicote surtisse efeito, como a demissão de trabalhadores (cristãos, inclusive), apenas a título de exemplo.

Pelo que consta, não funcionou tão bem assim o boicote à rede americana Target. Penso que faltaram melhores informações e fontes mais fidedignas a respeito, o que desvaloriza e enfraquece o argumento que se quer defender. De fato, houve sim um levantamento de assinaturas pela AFA (American Family Association), mas os balancetes da empresa demonstram não ter sentido o baque.

Conceito se combate com conceito. Para toda proposta há uma contraproposta; para toda tese, uma antítese. E aí faltou polidez no debate. Faltou estética na exposição. O abundante uso dos irritantes rashtags no post soaram agressivos, gritantes. Talvez um texto mais sóbrio e equilibrado, com viés dissertativo, provocasse menos frisson.

A terceira Lei de Newton afirma que para toda ação em forma de força exercida sobre um determinado corpo, há uma reação de mesma força e direção, em sentido oposto. Pois bem: o contra-ataque já começou, com outras megastores de departamentos como a Riachuelo. Não há como afirmar, mas pode ser que, atentando-se ao método de exposição, a represália tomasse menores proporções e o tiro não saísse pela culatra.

UMA COISA É UMA COISA...

Uma infinidade de comentários ao post nada tinham com seu conteúdo. Não foram poucos os vorazes bombardeios verbais à família Valadão e aos pastores da Igreja Batista da Lagoinha. Vários se aproveitaram da oportunidade para destilar seu veneno contra os evangélicos, genericamente, ou apedrejar os supostos larápios dos dízimos dos cegos fiéis. Ora, em que pese a atuação lamentável de hodiernos mercadores da fé, definitivamente aquele não era o espaço nem a ocasião propícios para a discussão. 

Quem não gostou do conteúdo da postagem, que se expresse, demonstre sua insatisfação e discordância. Entretanto, esconder-se covardemente atrás de perfis virtuais para afrontar toda a igreja evangélica, tratar os dizimistas como alienados, incultos e estultos, definitivamente não é atitude que credencie tal indivíduo a criticar outrem.

Não há que se adentrar méritos ou deméritos da autora do post. Estou bastante convencido de que nenhum dos críticos manifestos, sobretudo os mais mordazes, convive sistematicamente com ela. Nenhum deles a conhece suficientemente a ponto de julgar-lhe ou apontar-lhe lacunas éticas e morais. Tenho uma série de ressalvas à Ana Paula Valadão, mas relacionadas à sua teologia, não à sua conduta. Logo, isso não me confere o direito de atacá-la pessoalmente. Se por um lado falou demais e deu bom dia a cavalo, por outro, suas canções e ministério inegavelmente têm abençoado centenas de milhares Brasil afora. Todo caso, valer-se de qualquer assunto para ofensas pessoais denota baixeza, desrespeito e inabilidade intelectual. 

CONCLUSÃO

Ana Paula mais acertou do que errou. Mais vale a essência do que a forma. O post não trata de homofobia. Não trata de ataque ou agressão ao indivíduo homossexual. Não é pessoal. Ela se levanta contra o conceito, contra o princípio, contra a ideia. E nisso está correta. No entanto, o método pelo que se expressou, demonstrou-se por fim infeliz e ineficaz.

Eventualmente, caso cristão, você pode estar pensando neste momento: "Deus nos chamou para amar; não para causar polêmica". Pois bem, qualifiquemos o conceito: a pregação do evangelho é uma espada de dois gumes; traz salvação, mas também o juízo; traz a paz, mas também a guerra; traz vida, mas também a morte. O mesmo Deus que é amor, é fogo consumidor; o Jesus que batiza com Espírito Santo, para salvação, também batiza com fogo, para condenação. Não há como levarmos a pregação do evangelho pela metade.

Indubitavelmente é obrigação da igreja respeitar e amar o homossexual. Contudo, esse mesmo amor nos responsabiliza a conscientizá-lo quanto à necessidade do abandono de tal prática. Sem eufemismos. Ora, se essa pessoa for regenerada pelo Espírito Santo, é óbvio que Deus a aceitará em sua presença e a amará! Mas lembremo-nos: ainda que por ocasião do novo nascimento Deus receba o indivíduo como estiver, jamais deixará passar incólumes os seus pecados. Antes, corrigirá todo e qualquer desvio mediante o processo de santificação. Jesus perdoou a mulher acusada de adultério, porém foi claro: "não peques mais" (João 8.11). Infelizmente, sob os auspícios da não-confusão ou mesmo do amor de Deus, a igreja tem abandonado as pregações do justo juízo de Deus, assunto abundante nas Escrituras, e contraponto indissociável da própria mensagem de salvação. 

Somos a contracultura. Remamos contra a maré. Inequivocadamente deparar-nos-emos com uma carga cada vez maior do lobby anticristão. As portas do inferno não nos resistirão desde que tomemos posição e avancemos intrépida e destemidamente. Enquanto descansamos sob uma letargia travestida de pacifismo, o adversário ganha terreno. Portanto, antes de endossar o coro dos críticos e tomar seu assento junto à promotoria, convém ponderar: em nome do não-confronto, seria a omissão a melhor resposta às afrontas aos princípios que defendemos?